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quinta-feira, 28 de julho de 2011

CPC – IV - Procedimentos especiais

Roteiros de aula para Procedimentos Especiais.

Apenas estão postados os tópicos dos assuntos que serão tratados em sala de aula.

Os roteiros abaixo não representam e nem constituem a única forma de o aluno preparar-se para as avaliações, já que são apenas uma forma de ordenar cronologicamente os temas que o professor irá discorrer em sala de aula. Para as avaliações será imprescindível contar com as notas elaboradas presencialmente.

Assim recomenda-se a impressão com espaçamento duplo para que o aluno insira o que foi ministrado pessoalmente pelo professor.

 

consignação em pagamento

depósito – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos do CPC

anulação e substituição de títulos ao portador – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos do CPC

prestação de contas: arquivo-1 //// arquivo-2

possessórias: arquivo-1 //// arquivo-2

nunciação de obra nova

usucapião

divisão e demarcação

inventário e partilha

embargos de terceiro

habilitação – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos do CPC

restauração de autos – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos do CPC

vendas a rédito com reserva de domínio – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos do CPC

juízo arbitral – sem roteiro. será aplicado observando-se os artigos da lei 9.307/96

monitória

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Armadilha com ratoeira mata suposto ladrão: isso é permitido?

LUIZ FLÁVIO GOMES*

Um trabalhador da zona rural em Formosa (GO) colocou em sua casa uma armadilha feita com ratoeira e projéteis mortais. A armadilha funcionou e matou o suposto ladrão. Isso é permitido ou proibido? Na nossa opinião houve abuso, houve excesso. Houve homicídio doloso (intencional).

O tema, tecnicamente falando, nos conduz ao conceito de ofendículos. Ofendículos (ou offendicula ouoffendiculum) são os obstáculos ou meios empregados para impedir eventual ofensa a bens jurídicos (patrimônio, domicílio etc.). Exemplos: cacos de vidro sobre muros, pontas de ferros sobre portões, cão de guarda etc. Os ofendículos podem ser ativos (cão de guarda, v.g.) ou passivos. Estes envolvem também a chamada “defesa mecânica predisposta” (que são aparatos prontos para disparar quando há a abertura de uma porta ou de uma janela, v.g.).

Dentro do conceito de ofendículos ainda podemos inserir as cercas elétricas (que, em regra, são autorizadas por leis municipais, a partir de uma certa altura). Câmera de vídeo não é um ofendículo porque não visa a impedir eventual ofensa ao bem jurídico, mas sim a comprovar essa ofensa. Já o alarme (constituindo um obstáculo) é um ofendículo.

Quando a colocação e o seu funcionamento são regulares (sem excesso, sem abuso, proporcional, moderado, equilibrado) não existe criação de risco proibido, logo, fica desde logo excluída a tipicidade material (e o crime). Na colocação regular não há desvalor da conduta nem do resultado (proporcional). Não há crime.

Cuida-se de atividade que exterioriza riscos permitidos (enquanto haja moderação na colocação e no uso). A eletrificação de uma cerca configura, em princípio, risco autorizado (aliás, muitos municípios disciplinam essa matéria expressamente). Até aqui, nenhuma ponderação de bens é exigida. O dono da casa tem direito de eletrificar a sua cerca, ainda que isso represente riscos para terceiras pessoas. Quem cria riscos permitidos não comete crime (de perigo para vida ou saúde alheias). Não há desaprovação da conduta (quando ela gera risco permitido).

Natureza jurídica dos ofendículos:existe divergência doutrinária sobre a natureza jurídica dos ofendículos. Alguns sustentam que seria legítima defesa predisposta ou preordenada. Para nós a colocação dos ofendículos deve ser regida pelo instituto do exercício regular de um direito. Seu eventual funcionamento ingressa no terreno da antijuridicidade.

A colocação dos ofendículos, desde que dentro dos limites legais e razoáveis, constitui exercício regular de direito (excludente da tipicidade material). Quando tais ofendículos funcionam concretamente, resta ao juiz examinar se o exercício do direito foi ou não regular. Se foi regular, não há tipicidade material (não há criação de risco proibido); se foi irregular (abusiva, excessiva) há tipicidade material. Só então passa a analisar a questão da antijuridicidade.

Uma coisa nos parece certa: não pode nunca haver excesso (desproporcionalidade): uma cerca elétrica colocada de modo irregular não pode chegar ao extremo de matar uma pessoa para a pura e simples defesa do patrimônio (pode-se dizer a mesma coisa da defesa mecânica predisposta excessiva).

Recorde-se: para salvar o bem jurídico patrimônio não podemos sacrificar uma vida. A desproporcionalidade é patente. A falta de moderação é evidente. De qualquer modo,se a cerca elétrica ou a defesa mecânica foi colocada regularmente, sem excesso, não há criação de risco proibido. Mesmo que uma criança venha a falecer quando pretendia superá-la, não há tipicidade material. Não há risco proibido.

A questão fica complicada quando há excesso: alta potência não permitida, “armadilha mortal feita com ratoeira” (esse é o caso do trabalhador rural de Formosa-GO, que predispôs a armadilha e matou um suposto ladrão, com dois projéteis no peito, em julho de 2011) etc..

Se a colocação ou predisposição foi irregular (abusiva, excessiva), três situações possíveis: (a) resultado moderado; (b) resultado justificado e (c) resultado desproporcional (excessivo).

Nesse caso há a criação de risco proibido. Logo, existe tipicidade material. Só resta examinar a questão da antijuridicidade (proporcionalidade entre o ataque e a reação, entre o bem jurídico protegido e o ofendido etc.).

Primeira situação: se a cerca irregular ou a defesa mecânica predisposta excessiva gera um resultado moderado (uma lesão, um ferimento, um pequeno choque etc.), estamos diante de um resultado não exagerado, não desproporcional. O meio era excessivo, mas o uso foi moderado. Legítima defesa indiscutível. Está excluída a antijuridicidade.

Segunda situação: se o aparato predisposto (o ofendículo) mata justamente quem anunciou previamente que queria pular o muro da casa para estuprar a esposa e/ou matar o marido, nesse caso há legítima defesa (pela natureza dos bens jurídicos envolvidos). Fala-se aqui em legítima defesa preordenada ou predisposta. Fica excluída a antijurididicade. Resultado justificado.

Terceira situação: e se o ofendículo atinge uma criança inocente, que apenas pretendia alcançar sua bola? Foi gerado um resultado desproporcional. Tendo havido colocação excessiva (no princípio), o fato é materialmente típico e antijurídico. Sempre que o resultado seja previsível e haja concorrido dolo ou imprudência (isto é, se o sujeito criou um risco proibido), responde por crime doloso ou culposo. Se tinha mesmo a intenção de matar determinada vítima, crime doloso. Se não tinha a intenção de matar ninguém, mas concorreu com culpa, homicídio culposo.

*LFG – Jurista e cientista criminal. Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito penal pela USP. Presidente da Rede LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

Posse/porte de munição: crime de mera conduta que se consuma independentemente da apreensão conjunta de arma de fogo

 

Pablo Hernandez Viscardi

Promotor de Justiça, titular da 2ª Promotoria de Justiça de Cerejeiras

Diuturnamente, como operadores do direito, vemo-nos diante de decisões judiciais e entendimentos doutrinários que aplicam o garantismo penal na sua vertente mais extrema. Em casos desse naipe, valem-se os estudiosos e aplicadores da lei de procedimentos intelectuais espúrios que deturpam a finalidade da norma penal, sob o argumento de que estão assegurando direitos ditos por eles constitucionais, mas que sequer constam expressa ou implicitamente no corpo de nossa Constituição Federal, ou que, quando amparados por princípios da Carta Magna, em razão do raciocínio por eles operado ser fruto de ilações abstratas, fogem dos exatos termos da norma penal.

Um dos exemplos mais expressivos do entendimento equivocado acima citado são as recentes decisões que anunciam ser indispensável para a configuração do crime de posse ou porte de munição a apreensão, em conjunto, de arma de fogo, posto que, para elas, a munição, por si só, não tem o condão de produzir qualquer lesão a bem jurídico tutelado pela norma penal, sendo sua apreensão isolada, portanto, mero irrelevante penal.

Peço vênia para transcrever duas delas, uma oriunda do Superior Tribunal de Justiça e outra advinda do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia:

"Munição (porte ilegal). Arma (ausência). Potencialidade lesiva (inexistência). Atipicidade da conduta (caso). 1. A arma, para ser arma, á de ser eficaz; caso contrário, de arma não se cuida. Do mesmo modo, a munição necessita da presença da arma. 2. Assim, não comete o crime de porte ilegal de munição, previsto na Lei nº 10.826/03, aquele que, sem a presença da arma de fogo, carrega munição. Isto é, não há potencialidade lesiva. Recurso especial improvido. (STJ – RECURSO ESPECIAL; Resp 1113247 RS 2009/0059520-5. Órgão Julgador; T6 – SEXTA TURMA, Publicação: 30/11/2009)

"A posse ou porte de munição sem alcance à respectiva arma não tem capacidade para submeter a risco ou perigo concreto o bem jurídico tutelado pela norma incriminadora, impondo-se a absolvição por atipicidade da conduta. (TJRO, 0018367-08.2009.8.22.0022 Apelação, Relatora : Desembargadora Ivanira Feitosa Borges, Revisor : Desembargador Valter de Oliveira, Publicado em 13/01/2011).

 

Todavia, não obstante o conhecimento jurídico ímpar dos prolatores e a sedução dos argumentos ostentados, ousamos discordar de seu conteúdo.

Antes de adentrar no cerne da questão, importante trazer a baila as razões da incriminação das condutas de possuir e portar artefatos bélicos, incluindo-se ai as munições.

Segundo as lições de Guilherme de Souza Nucci:

"(...) Observou-se, nos últimos dez anos, uma modificação essencial no quadro das leis de controle e repressão ao comercio e uso indevido de armas de fogo, com considerável melhora para a segurança pública. À época em que portar uma arma de fogo, sem autorização legal, era considerada mera contravenção penal, vislumbra-se uma situação caótica e havia a crescente popularização do uso de armas. Notava-se que a punição branda constituía um fator de incentivo a quem, embora cidadão honesto, resolvesse carregar ou manter em casa uma arma ilegal. Quantos não eram os crimes banais, cometidos em tolas discussões de correntes de acidentes de trânsito, pelo emprego de arma de fogo? Incontáveis. A falsa aparência de segurança, de quem portava arma, várias vezes, terminava em tragédia pelo uso indevido do instrumento vulnerante em brigas de bar e em casas noturnas. Era preciso tomar uma providência no campo legislativo, o que ocorreu primeiramente, em 1997, com a edição da Lei 9.437, transformando a contravenção penal de porte ilegal de arma de fogo em crime. Houve imperfeições na lei, que foi aprimorada pela edição do atual Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003). Buscou-se, inclusive, proibir por completo o comércio de armas de fogo no Brasil, invocando-se um referendo popular para aprovar ou desaprovar o art. 35, caput, da Lei 10.826/2003(...) Ocorre que, a proliferação incontrolada das armas de fogo pelo País pode levar à sensível piora na segurança pública, pois não somente o criminoso faz uso indevido desses instrumentos, mas também o pacato indivíduo que, pela facilidade de ter e usar uma arma de fogo, pode ser levado a resolver conflitos fúteis com a agressão a tiros, gerando homicídios e lesões corporais de toda espécie cometidos de forma leviana e inconsequente(...) [01] (destacamos).

Fácil perceber, então, que a "mens legis" e "mens legislatoris", ao erigir as condutas de possuir ou portar artefatos bélicos como crime é única e exclusivamente tutelar a segurança pública, a paz coletiva.

Vai além esse doutrinador, ao comparar a criminalização dos artefatos bélicos com a tipificação penal das substâncias entorpecentes:

"(...) A mesma razão que leva o Estado ao controle rígido das substâncias entorpecentes, buscando preservar, na medida do possível, a saúde pública, também promoveu a edição da Lei 10.826/2003, almejando maior possibilidade de garantir a segurança pública e a paz social" [02]

Portanto, diferentemente do sustentado pelas decisões que ora debatemos, tem-se que o bem jurídico tutelado pelo delito descrito no artigo 12 da Lei Federal nº 10.826/2003 é a segurança pública, a paz coletiva e não a integridade física de um cidadão individualizado.

Situação idêntica é experimentada pelo crime de posse de drogas, quedado no artigo 28 da Lei Federal nº 11.343/2006, cuja objetividade jurídica não é a tutela da integridade física e psíquica do usuário isolado, que tem livre-arbítrio para fazer o que bem entender com seu próprio corpo, mas sim a saúde pública, a vida e integridade física da sociedade como um todo. Ao erigir tal conduta como criminosa, quis o legislador obstar, dificultar o uso da droga, tendo em vista a tutela da coletividade e não de uma pessoa só.

Assim, ao se prever no delito insculpido no artigo 12 do Estatuto do Desarmamento ser crime possuir munição, quis o legislador tutelar a coletividade, a paz social, a segurança pública e não a integridade física deste ou daquele indivíduo isoladamente.

Portanto, ao utilizarmos tais considerações como premissa, forçoso concluir que a tese ora guerreada, que sustenta a indispensabilidade da apreensão da arma de fogo junto com a munição para a configuração do delito de posse ou porte de arma cai por terra, pois tal crime, por ter como objetividade jurídica a tutela da segurança pública, da paz social, consuma-se com a simples conduta de portar ou possuir a munição, ou seja, trata-se, pois, de crime de mera de conduta ou de perigo abstrato.

Nestes termos, a lesividade jurídica está presente na simples posse da munição, pois adquirida, seja de forma paga ou gratuita, mediante comércio ilegal, figura esta que a lei pretende combater, conforme já citado alhures.

Em outras palavras, para se combater o comércio ilegal de artefatos bélicos, tem-se como condição "sine qua non" a repreensão daqueles que se valem dessa atividade, auferindo lucros ou não. Sendo mais claro, ao se repreender aquele que possui ou porta arma, munição e outros artefatos de forma irregular atua-se visando atacar o tráfico ilegal desses objetos e não só a conduta individualizada do possuidor ou portador, daí porque se sustentar que o crime em apreço é de mera conduta, tornando desnecessária, para sua consumação, a ofensa a bem jurídico individual.

Portanto, a lesividade jurídica, "in casu", está presente no simples fato do agente possuir ou portar a munição sem a autorização ou em desacordo com determinação regulamentar.

Nesse sentido, trago à baila vasta jurisprudência:

48355150 - APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. APREENSÃO DE 154,08G DE MACONHA E 20,64G DE COCAÍNA. PRISÃO EM FLAGRANTE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PRELIMINAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INVIOLABILIDADE DO DOMICÍLIO. REJEIÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. CRIME DE MERA CONDUTA E DE PERIGO ABSTRATO. PENA. REDUÇÃO. EXCLUSÃO DA AVALIAÇÃO NEGATIVA DA CONDUTA SOCIAL E DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PEDIDO DE REDUÇÃO DA PENA PARA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL EM RAZÃO DE CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 231 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS OBJETIVOS NÃO ATENDIDOS. ALTERAÇÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. REGIME INICIAL FECHADO IMPOSTO PELA LEGISLAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não há nulidade, no caso dos autos, da prisão em flagrante, pois os policiais, investigando denúncia anônima sobre tráfico e uso de entorpecentes, observaram que o apelante comercializou droga em seu domicílio, o que autoriza o ingresso neste ainda que sem autorização judicial. Ademais, como os crimes de tráfico de drogas e de posse ilegal de munição de uso permitido são permanentes, sua consumação e, consequentemente, o estado de flagrância, se prolongam no tempo. Assim, havendo flagrante delito, o princípio da inviolabilidade do domicílio - que não é absoluto - fica mitigado, como autoriza o próprio artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal. 2. Estando a autoria do crime de tráfico de drogas devidamente caracterizada pelos depoimentos harmônicos e coesos dos policiais, tanto na Delegacia quanto em Juízo, e pela prisão em flagrante do réu, incabível a absolvição do apelante. 3. Descabida a desclassificação do crime de tráfico ilícito de drogas para o crime de porte para consumo próprio quando o condenado, além de ter sido surpreendido com mais de 150 gramas de maconha e 20 gramas de cocaína e com dinheiro distribuído em várias notas de diversos valores, é visto em atitude suspeita, entregando algo a terceira pessoa e recebendo dinheiro em troca. 4. A doutrina e jurisprudência consideram o crime de posse de munição como de mera conduta e de perigo abstrato, sendo irrelevante, para sua configuração, a ocorrência de resultado lesivo ou situação de perigo concreto. 5. Não pode a folha penal servir de base para a avaliação desfavorável da circunstância judicial da conduta social, a qual deve ser extraída da projeção do indivíduo enquanto ser social. 6. Deve ser afastada a avaliação negativa das circunstâncias do crime quando não apontados pela sentença quaisquer elementos que não aqueles ínsitos ao próprio tipo penal. 7. A incidência de circunstância atenuante não autoriza a redução da pena-base para aquém do mínimo legal. Súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça. 8. Não preenchidos os requisitos objetivos estabelecidos no artigo 44 do Código Penal, incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. 9. Considerando tratar-se de condenação pela prática do crime de tráfico de drogas, cometido em 28/7/2010, a eleição do regime prisional no inicial fechado decorre de expressa previsão legal (artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/1990) 10. Recurso conhecido, preliminar rejeitada e, no mérito, parcialmente provido para, mantida a sentença que condenou o apelante nas sanções do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e do artigo 12 da Lei nº 10.826/2003, afastar, quanto ao primeiro crime, a avaliação negativa da conduta social e, quanto ao segundo crime, a avaliação desfavorável da conduta social e das circunstâncias do crime, reduzindo-se sua pena para 05 (cinco) anos e 09 (nove) meses de reclusão, 01 (um) ano de detenção, no regime inicial fechado, e 570 (quinhentos e setenta) dias-multa, no valor mínimo legal. (TJDF; Rec. 2011.01.1.002108-4; Ac. 495.133; Segunda Turma Criminal; Rel. Des. Roberval Casemiro Belinati; DJDFTE 12/04/2011; Pág. 163) (destacamos)

"HABEAS CORPUS. POSSE DE MUNIÇÃO E ACESSÓRIOS DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. POTENCIALIDADE LESIVA DO ARMAMENTO APREENDIDO. IRRELEVÂNCIA. DESNECESSIDADE DO EXAME. CRIME DE MERA CONDUTA. COAÇÃO ILEGAL NÃO EVIDENCIADA. ACÓRDÃO CONDENATÓRIO MANTIDO. 1. O simples fato de possuir munição e acessórios de arma de fogo de uso restrito caracteriza a conduta descrita no art. 16, da Lei n. 10.826, por se tratar de delito de mera conduta ou de perigo abstrato, cujo objeto imediato é a segurança coletiva, configurando-se o delito com o simples enquadramento do agente em um dos verbos descritos no tipo penal repressor. 2. Ordem denegada" (HC 95604/PB 2007/0284093-2 Rel Ministro Jorge Mussi – 5ªT – Dje 03/05/2010 – STJ)

"PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 14 DA LEI 10.826/03. POSSE DE MUNIÇÃO. APREENSÃO DA ARMA DE FOGO. IRRELEVÂNCIA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A posse de munição sem a devida autorização da autoridade competente configura o delito previsto no art. 14 da Lei 10.826/03, sendo irrelevante a não apreensão da arma de fogo compatível com os projéteis. Precedentes. 2. Recurso especial conhecido e provido para, anulando o acórdão recorrido, restabelecer a sentença condenatória" (Resp 1119270/RS 2009/0013263-0 – Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima – Dje 03/05/2010).

"Informativo nº 457 – STF. A turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende, por ausência de potencialidade lesiva ao bem jurídico protegido, o trancamento da ação penal instaurada contra denunciado pela suposta prática do crime de porte de munição sem autorização legal (Lei 10.826/2003, art. 14), sob o argumento de que o princípio da intervenção mínima do Direito Penal limita a atuação estatal nessa matéria. O Min. Eros G|rau, relator, não obstante seu voto proferido no RHC 81057/SP (DJU de 29.4.2005), no sentido da atipicidade do porte de arma desmuniciada, indeferiu o writ por entender que a interpretação a ser dada, na espécie, seria diferente, uma vez que se trata de objeto material diverso: porte de munição, o qual é crime abstrato e não reclama, para sua configuração, lesão imediata ao bem jurídico tutelar. Após, o Min. Joaquim Barbosa pediu vista. (HC 90075) (grifei)

"Informativo nº 497 – STF. A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que a Defensoria Pública da União sustenta que o simples porte de munição sem autorização legal não representa ofensa ao bem jurídico protegido pela Lei 10.826/2003, qual seja, a paz social. O Min. Joaquim Barbosa, relator, indeferiu o writ, no que foi acompanhado pelo min. Eros Grau. Ressaltando que a intenção do legislador fora de tornar mais rigorosa a repreensão aos delitos relativos às armas de fogo, considerou que o crime de porte de munição seria de perigo abstrato e não feriria as normas constitucionais nem padeceria de vícios de tipicidade. Enfatizou que a aludida norma tem por objetivo a proteção da incolumidade pública, sendo dever do Estado garantir aos cidadãos os direitos fundamentais relativos à segurança pública. Ademais, asseverou que, no caso, o paciente também fora condenado, em concurso material, pela prática do crime de receptação, não sendo o porte de munição um fato isolado. Assim, tendo em conta essas particularidades, concluiu no sentido da tipicidade material da conduta, aduzindo que, para se afirmar o contrário, seria exigível o revolvimento das provas dos autos, incabível na via eleita. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Cezar Peluso" (HC 92533).(destaquei).

Portanto, o delito em tela consuma-se independentemente da ocorrência do resultado naturalístico específico, bastando a posse ou o porte da munição para a incidência do tipo penal.

Ainda, importante destacar que o crime em comento abarca várias figuras típicas: possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo (1), acessório (2) ou munição (3). De molde que, na verdade, cria três condutas criminosas distintas, uma para cada figura, pois possuir/portar arma de fogo é distinto de possuir/portar acessório que, por sua vez, não se identifica com possuir/portar munição.

E a previsão legal da diversidade de artefatos foi intencional, pois quis o legislador, com isso, consignar expressamente que cada figura típica, muito embora esteja descrita no mesmo tipo penal, constitui um delito isolado.

Ora, e se é assim, ou seja, se o simples fato de possuir ou portar munição é expressamente considerado como crime, exigir a apreensão da arma de fogo em conjunto com a munição, como é o entendimento sustentado nas decisões debatidas, fato este (possuir/portar arma de fogo) que é considerado crime por si só, seria um contra-senso, tornando letra morta a previsão expressa da posse/porte de munição. E as leis não contém palavras inúteis, como bem propalado pela doutrina jurídica.

Em outras palavras, exigir para a configuração de um tipo penal (posse/porte de munição) um elemento (apreensão também da arma de fogo) que, por si só, seria suficiente para a consumação de um outro delito (posse/porte de arma de fogo), seria condenar de morte a figura típica inicial (posse/porte de munição), vez que essa seria desnecessária, posto que já consumado o outro delito (posse/porte de arma de fogo).

Certamente essa não era e não foi a intenção do legislador. Pelo contrário, ao prever vários artefatos bélicos no tipo penal, quis criar uma conduta criminosa para cada um deles, conclusão esta que não se coaduna com a posição exposta nas decisões guerreadas.

Ademais, se considerado penalmente atípico o fato de a munição ter sido apreendida sem o objeto que a aciona, igualmente seria atípica a conduta de portar droga sem seu respectivo "veículo" (v.g. seringas, cachimbo, papel-seda etc), pois apesar de conter princípio ativo, constatado por meio de perícia (equivalente à potencialidade lesiva da arma/munição), não haveria viabilidade de ministração da substância.

Assim, é equivocada a premissa de que a ausência do "veículo" leva à atipicidade da conduta.

Outrossim, a aferição da (in)eficiência passa necessariamente pela análise do art. 17 do CP, e considerando que "arma" e "munição" apresentam funcionamentos (e defeitos) diversos, é até possível que um ou outro apresente inviabilidade, e isso não necessariamente levaria à atipicidade da posse destes artefatos.

Mais. Ainda que apresente defeito, a perícia deve indicar se tal mal-funcionamento é superável; pois se for, a ineficácia não é absoluta, mas relativa, fugindo dos estritos termos do citado art. 17 do CP.

Portanto, com base em todas as argumentações acima expostas, temos que as decisões transcritas alhures, com o devido respeito, não merecem prosperar no mundo jurídico, devendo ser repelidas pelos operadores do direito, haja vista que os crimes em tela têm como objetividade jurídica a paz social e a segurança pública, bens estes solapados com a simples conduta de possuir ou portar munição em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Do contrário, a prevalecer o entendimento ora guerreado, desnecessário seria este tipo penal.


Notas
  1. In Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, Ed RT, 1ª ed, pág, 249.
  2. ibidem

Armas jogadas as fornalhas…

A atuação da Advocacia-Geral da União garantiu o envio de mais de 1.700 armas de fogo e de cerca de 300kg de munição para destruição ou uso do Exército Brasileiro. O material foi apreendido no estado de Tocantins em operações policiais de combate ao crime, inquéritos e processos criminais.

O procurador-chefe da União no estado, André Luís Rodrigues, informou que há nove meses a procuradoria começou a encaminhar às Justiças Federal e Estadual pedidos para que as armas retidas fossem entregues ao 22º Batalhão de Infantaria do Exército em Tocantins, por meio de ofícios e petições.

"Desde o inicio das diligências da PU/TO junto aos diversos juízes estaduais e federais, o Exército recebeu 1.023 armas de fogo curtas, 710 longas e, aproximadamente, 300 kg de munição para destruição, das diversas Comarcas do Estado e Departamento de Polícia Federal", ressaltou.

A atuação proativa da Procuradoria busca cumprir o artigo 25 da Lei nº 10.826/03, com redação da Lei nº 11.706/08, que determina a entrega das armas de fogo em 48 horas pelo juízo, para destruição ou doação aos órgãos de segurança pública ou às Forças Armadas, após a elaboração do laudo pericial e a sua juntada ao processo. A Resolução nº 134 do Conselho Nacional de Justiça também determina esse posicionamento pela Justiça. Com informações da Assessoria de Imprensa da AGU.

Revista Consultor Jurídico, 22 de julho de 2011.

Em exemplo !!!

Penas convertidas em compra e doação de livros

O Ministério Público Federal (MPF) tem proposto a conversão da pena em compra de livros a réus que fizerem acordos judiciais. O projeto piloto foi idealizado pelo MPF em São Carlos, cidade a 232 km de São Paulo, inspirado em iniciativa semelhante adotada pela Justiça Estadual em Presidente Venceslau (SP) no ano passado – um juiz decidiu aplicar a doação de livros no lugar de cestas básicas em crimes como porte de drogas e lesões corporais.

Pessoas suspeitas de cometerem crimes federais considerados leves, como descaminho, contrabando, desacato e falso testemunho, podem receber a proposta de doar livros em vez de responder ao processo se a sanção aplicável for inferior a dois anos e se não possuírem antecedentes criminais.

O procurador da República Ronaldo Ruffo Bartolomazi, que apresentou a ideia de parceria à Secretaria de Municipal do município, explicou que, atualmente, os recursos provenientes de acordos judiciais realizados no âmbito da Justiça Federal em São Carlos não estão vinculados a nenhum projeto específico. “O dinheiro resultante desses acordos é encaminhado a entidades filantrópicas ou assistenciais cadastradas perante o MPF e a Justiça Federal”, afirmou.

Essa modalidade de acordo tem sido proposta há sete meses. Até o início mês de julho, três processos resultaram em acordo e foram doados às bibliotecas do município 80 novos livros. Segundo informações do Jornal Folha de S. Paulo, um quarto acordo foi feito neste mês: serão doados R$ 1.650,00 em livros, valor que será dividido em dez vezes.

Bartolomazi ressaltou que o acordo é facultativo, podendo ser realizado antes do início da persecução penal e durante seu andamento. O sistema de bibliotecas do município de São Carlos atualizará, mensalmente, uma lista com livros demandados pelas unidades. Desse modo, os réus que aceitarem o acordo poderão escolher os títulos que desejam, comprá-los conforme o valor fixado e levá-los à Secretaria de Educação, onde receberão um comprovante da doação.

(Érica Akie Hashimoto). IBCCRIM.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Processo eletrônico pode padronizar petições

POR ALESSANDRO CRISTO que é editor da revista Consultor Jurídico

A advocacia está às portas de uma revolução. O casamento entre o processo eletrônico e o número cada vez maior de litígios na Justiça pode ter como consequência uma pasteurização das petições. Sistema criado pelo Conselho Nacional de Justiça para informatizar ações, o Processo Judicial Eletrônico (PJe) já prevê modelos de pedidos para facilitar a vida de juízes e seus assessores. O intuito é economizar tempo e concentrar a atenção de quem julga no que a parte realmente está requerendo. Para quem considera a advocacia uma arte, no entanto, a tendência pode significar o cerceamento de um trabalho intelectual por natureza.

Questões trabalhistas serão as primeiras expostas à mudança. Até o fim do ano, o sistema deve estar funcionando em todos os Tribunais Regionais do Trabalho do país, de acordo com o juiz assessor da presidência do CNJ Paulo Cristóvão Silva Filho, que acompanha a instalação do PJe. Para recursos no Tribunal Superior do Trabalho, por exemplo, já há modelos de petições disponíveis.

"A Justiça do Trabalho vai formularizar alguns pontos, mas não obrigar a utilização do modelo", afirma. "A objetivação vai acontecer nos processos que são comuns, de massa." Com a novidade, será possível ao advogado saber, inclusive, a porcentagem de sucesso de petições idênticas em todos os tribunais do país. "Vamos reunir algumas informações básicas também para verificação de prevenção nacional", explica.

A princípio, apenas as cortes laborais adiantaram a intenção. Nas demais, os advogados poderão subir seus próprios modelos de petição para o sistema, por meio de login pessoal. "Ainda não estamos culturalmente preparados para uma pasteurização. Seria uma imposição ao advogado", avalia Paulo Cristóvão. "A advocacia mais artesanal vai existir sempre. Ela é o nascedouro das ações de massa."

Não é esse o prognóstico de um dos advogados que acompanha a implantação do PJe pela Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Fernando Martins Castro, do escritório Martins Castro Monteiro Advogados. "Hoje, o modelo tradicional de advocacia que conhecemos não dá mais conta da demanda. Essa seria uma forma de dar uma vazão mais rápida", afirma Castro, que é membro da Comissão de Informática do Conselho Federal da OAB.

Muito da mudança se deve às novas gerações que têm desembarcado na profissão, como avalia o advogado, que também é doutor em Direito e Informática pela Faculdade Montpellier, na França, e mestre em Direito Civil pela USP. "A juventude tem outra dinâmica, o que pode se ver pelas redes sociais. É uma forma de se expressar mais superficial, mas não necessariamente pior. É apenas uma mudança de paradigma verbal, de representação dos fatos", diagnostica.

A Lei de Processo Eletrônico — Lei 11.419, de 2006 — exibe esse traço, segundo ele. "É possível juntar um vídeo ou um documento eletrônico em vez de uma petição de 40 páginas", diz. "E hoje, no país, 4% dos processos já estão em meio exclusivamente digital."

Solução prática
Petições extensas são um problema, por exemplo, em tribunais superiores. É comum a prática de alguns ministros de estabelecer quotas semanais de processos por assessor, no intuito de não deixar o acervo acumular. Só no TST, por exemplo, entram em média mil recursos diariamente. "Considerando as metas propostas nos gabinetes e a produção semanal, costuma-se despender, em média, 30 minutos em cada caso", explica o professor de Direito do Trabalho Gáudio Ribeiro de Paula, que dá aulas nas Escolas Superiores de Advocacia de Brasília e São Paulo. "Os mesmos 30 minutos serão gastos para ler dez ou 100 páginas", alerta o professor, que trabalha como assessor de um dos ministros da corte. "A objetividade é uma virtude essencial."

Nos cursos que ministra, Gáudio dá dicas sobre como ser direto sem deixar informações importantes de fora. "É imprescindível decompor didaticamente as ideias estruturando, de forma ordenada, temas ou tópicos em capítulos, destacando aspectos relevantes com recursos como o negrito e o sublinhado, que devem se limitar ao essencial." O velho costume de se usar expressões em latim, por exemplo, já é uma gafe. "Diante do volume surreal de processos, seria como exigir de um soldado que mantivesse engraxados os seus sapatos durante um bombardeio."

Alguns ministros também não gostam da prolixidade. "Já vi uma censura expressa em um voto de uma ministra do TST no caso de um advogado que redigiu uma petição de mais de 500 páginas", conta o professor, que ministra curso sobre o assunto no dia 10 de agosto na ESA-SP, com abertura feita pelo ministro do TST Ives Gandra da Silva Filho. "Tenho citado nos cursos o exemplo de um advogado trabalhista de grande renome que, em geral, redige seus Embargos Declaratórios em uma ou duas páginas, e tem obtido grande êxito em suas causas", diz de Paula.

"O advogado precisa traduzir a questão de uma maneira sucinta para permitir ao juiz gastar tempo com o que interessa: ter uma percepção razoável da situação", concorda Luiz Fernando Castro. Segundo ele, em meio a centenas de recursos julgados em bloco numa única sessão pelos tribunais, o grande desafio é garantir que o pedido seja realmente lido.

A dinamização dos julgamentos pode interessar não só a julgadores, mas também a advogados, principalmente os que atuam em causas repetitivas. "Tenho um amigo gestor de processos sobre cartões de crédito em um banco que me disse: o caso curioso você me conta no chopp; no meu trabalho, o que interessa é quanto tempo a Justiça demora para julgar e qual é a média de ganho das causas", conta Castro. Faz todo sentido, levando-se em conta as avaliações feitas pelas instituições financeiras quanto à recuperação de dívidas e custo dos processos.

No entanto, levar a lógica capitalista para dentro da Justiça pode tirar o foco de quem é o alvo das decisões: as pessoas. "O processo não é um estorvo, uma decisão não é um produto e o Judiciário não é um supermercado", alegoriza um pessoa que já trabalhou como assessor de desembargadores e de ministros de tribunais superiores. Embora no gabinete em que atue não haja fixação de quotas semanais, ele afirma já ter passado pela experiência ao trabalhar para um ministro no Superior Tribunal de Justiça. "Como cidadão, não gostaria de ter o meu processo tratado como uma mercadoria nas mãos de um despachante aduaneiro, que diz apenas se estou no código amarelo ou vermelho."

Reféns da mudança
O processo eletrônico pode fazer outra vítima. A possibilidade de se mandar uma petição por meio digital para todo o Brasil, pelo menos em tese, ameaça a atividade dos escritórios que atuam como correspondentes em estados fora do eixo Rio-São Paulo. Hoje responsáveis pela protocolização de petições e controle de andamento de processos de grandes bancas, esses profissionais podem ter de se restringir ao contato com os julgadores locais em causas específicas e de maior importância.

"Bancas com grande volume de ações e necessidade de reduzir custos podem optar pelo modelo eletrônico, diante de um Judiciário que julga rápido e bem", considera Luiz Fernando Castro. "Pelo menos 50% do movimento processual dos fóruns tende a virar produção em massa, o que não é ruim, se oferecer um grau razoável de certeza e segurança."

Hoje, para peticionar mais de cinco vezes por ano em outro estado, segundo a lei, o advogado precisa obter inscrição suplementar na OAB local, e pagar a anuidade da entidade — o que não representa exatamente um obstáculo.

Quem também tende a sucumbir diante da informatização são as atuais regras processuais. Como cada tribunal disciplina o próprio procedimento, há uma infinidade de instruções a serem seguidas por quem conduz uma ação. Muitas delas superam as previsões dos Códigos de Processo. "Há limitações de tamanho para as petições, de quantidade de documentos, de horários de funcionamento, e marcos para início da contagem de prazos e constatação do seu cumprimento", exemplifica Castro.

Demonstração disso é a própria exigência da certificação digital para o ajuizamento. "A lei prevê apenas que o impetrante seja advogado", lembra o especialista. "Em São Paulo, isso não assusta, mas e no Acre? Além disso, hoje quem não tem banda larga não consegue advogar por meio eletrônico."

No TST, segundo Gáudio de Paula, o tamanho limite de arquivos com documentos é de 2 megabytes por processo. O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região, em Mato Grosso do Sul, estipulou o número máximo de 40 páginas para as petições iniciais.

De acordo com Paulo Cristóvão, apenas a Justiça Federal de São Paulo tem instalado o PJe. O Tribunal de Justiça do estado também aderiu, mas ainda está desenvolvendo o projeto piloto do sistema. A produção também caminha nos Tribunais Regionais Federais da 3ª e da 5ª regiões, assim como nos Tribunais de Justiça de Pernambuco e da Paraíba. O Tribunal Regional Federal da 2ª Região deve homologar sua versão no CNJ em setembro. O sistema ainda vai ajudar o Conselho a colher dados para o levantamento anual Justiça em Números — que avalia a litigiosidade e a produtividade em todas as cortes —, o que deve diminuir o trabalho dos juízes em passar essas informações.

Clique aqui para ler o manual do PJe.

terça-feira, 19 de julho de 2011

MEU PRIMEIRO HABEAS SPIRITUS

O fato abaixo é verídico e as testemunhas todas cristãs.

Tenho por hábito efetuar meus trabalhos de produção de textos no silêncio da noite. Divido assim meu dia em três etapas: uma primeira, matutina, onde me atualizo com as novidades do direito e assuntos de interesse, vejo a agenda do dia e publico nas minhas redes sociais. A segunda parte, a vespertina, atendo clientes e faço minhas idas ao fórum e outros locais. Ultimo o dia com uma sessão de desenhos animados e retorno ao escritório para o verdadeiro trabalho do dia: a produção intelectual onde todos os assuntos tratados vão se tornar arrazoados para serem distribuídos nas competentes repartições.

No final de um dia destes pode-se afirmar que retorno para casa bastante cansado. Milhões de coisas passam por minha cabeça. Não é incomum verem-me gesticulando e falando sozinho pelas ruas como quem está arrazoando num tribunal. É que as coisas não saem da minha mente e as fico repensando a todo instante.

Mas passo em frente ao Santuário de Nossa Senhora da Piedade e, mesmo sendo ele fechado as 21 horas, olho para seu majestoso edifício de arquitetura ímpar e, sentindo as boas energias que dali fluem, chego em casa com as forças reabastecidas para o meu merecido sono. Por morar muito próximo de meu escritório a caminhada não dura mais que 3 minutos. E por faze-la todos os dias o caminho é percorrido sem que eu me dê conta de muitas outras coisas no seu percurso.

Mas outro dia, aproximando-se do Santuário, ouvi gritos e gemidos (que pareciam femininos) clamando por socorro. Estas lamuriosas vozes tendiam já querer apagarem-se. Pareciam vir do Santuário! Não sou medroso ou tenho crença que santos aparecem a pecadores como eu. Mas naquele momento senti que algo estranho estava para acontecer.

Voltando-me na direção do refúgio espiritual, já sem luzes algumas no seu interior, notei que dali vinham as vozes. Pronto! Estava eu eleito para um contato direto com a divindade. Qual seria? Nossa Senhora? Sagrado Coração de Jesus (já que existe uma imagem sua em frente o Santuário)? Ou seria meu estimadíssimo Pe. Hugo, a quem recorro para que interceda por mim nos momentos que falta inteligência? Seria um santo desconhecido? Alguma pessoa que ali falecera? Que alma queria contato com este pobre miserável?

A igreja é frontalmente protegida por enormes grades. Nunca imaginaríamos que um local sagrado deveria ser protegido por lanças de três metros de altura. São coisas do tempo moderno. No meio, está o Santuário ladeado por outras duas entradas igualmente lacradas pelas lanças estilo romanas. A da direita franqueia acesso a centros de estudos e salas de reunião; a esquerda, ao espaço reservado para adoração ao Santíssimo Sacramento. E era desta segunda entrada que distancia-se dos gradis principais por uns 10 metros que as vozes clamavam a salvação dizendo “socorro!”, dizendo “liberte-nos!”.

Dois vultos que identifiquei tratarem-se femininos somente pela voz. Suas roupas escuras, rostos brancos cobertos por longos cabelos. Não tive dúvidas: são almas penadas. Daquelas que carregam culpas e pecados e não conseguiram libertar-se deste mundo material. Precisam de mim! De mim!?!?

Separados pelas grades que estão imediatamente próximas a rua e pelas outras grades que, após o jardim, ladeiam o prédio do Santuário, estávamos distantes e eu somente via aquelas “almas aflitas” pedindo a libertação daquele Santuário que as fazia refém.

A cena não me pareceu estranha. Eu já a presenciei noutros palcos, mas ali era a primeira vez. Como advogado criminalista tenho o costume de ficar do lado de fora das grades conversando com pessoas que, do outro lado pedem socorro. Mas geralmente o teatro é diferente: geralmente estou numa penitenciária ou nalguns destes cadeiões remanescentes dos tempos de claustros e das masmorras onde se amontoavam presos. Mas duma igreja, confesso ter sido a primeira vez que recebo pedidos de liberdade.

Sem temor, voltei-me para o lado de onde vinham as lamuriosas vozes e questionei o que se passava. Se acaso as almas dissessem querer liberdade eu diria que aquele local é o de liberdade e salvação de almas e que aguardassem a missa matutina para pedirem perdão e dali mesmo tomarem o rumo que o Julgamento Final as desse.

Mas a resposta a meu questionamento foi outra. Não eram almas, não eram bandidos. Pobre beata e sua jovem companheira estavam ali tolhidas de sair por haverem rezado demais! Assim explicaram-me que descuidando-se na ladainha, não perceberam o homem que tem as chaves da igreja (e que não é São Pedro) tinha selado todos os umbrais e as deixado ali penitentes.

Penitentes em penitenciária sagrada.

Não deixei de rir do inusitado e providenciei a chamada do porteiro da igreja (que não é São Pedro) e fiquei ali fazendo companhia a ambas trocando dedos de proza para amainar seus sofrimento de reclusas.

Mas descuidei-me que apenas eu as via, e a rua central da minha pequena cidade ainda era palco de movimento de vários transeuntes.

E o que estes passantes da noite viam? Um advogado, conhecido na cidade, agarrado a uma grade de igreja conversando com além. Já que não viam as incautas beatas que já não mais bradavam a liberdade.

O panorama de fato não estava muito a favor de minha sanidade mental. A conversa entre eu e as senhoras transcorria animada e eu, apoiado na grade frontal do Santuário, ria e lhes respondia nos casos que foram de desenrolando enquanto esperávamos as chaves (que não viriam de São Pedro).

Os passantes da rua deveras preocupados: uns com o desconhecido que lançava palavras ao vento direcionadas ao interior da capela do Santíssimo Sacramento; outros conhecidos deste causídico, preocupados com a entrega de seus processos a um desatinado que orava altas horas da noite abraçado a um gradil, como quem estava de boa proza com o além, quiçá com Padre Hugo que foi pároco por mais de 40 anos naquele Santuário, que já é falecido há vários anos; outros confidenciaram-me que tinham a certeza que estava eu fazendo um habeas spiritus já que habeas corpus se dá nos balcões forenses e é destinado aos vivos!

Não demorou muito um afetuoso amigo aproxima-se com ares de preocupação pelo louco que estava em sintonia com a divindade do Santíssimo Sacramento, mas não em oração, e sim em amistoso bate-papo, questionando-me sobre o que estava ocorrendo. Concomitantemente aproxima-se o responsável pelas chaves da igreja (que não era São Pedro) e o mistério se desfaz.

Após risos e gargalhadas das beatas presas, deste que falava aos espíritos, do guardador das chaves, dos transeuntes assustados com a cena, os portões que defendem o sacrossanto local novamente foram trancados aos vivos, e fomos para casa.

Beatas descobrindo o verdadeiro significado de “penitenciaria”: local de penitência.

Eu fazendo meu primeiro habeas spiritus.

Os demais passantes afirmando a minha sanidade.

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sexta-feira, 15 de julho de 2011

Que pode ser considerado um "mau" leitor?

Magna Campos

Professora de Redação Jurídica.Mestre em Letras: Discurso e Representação Social - UFSJ

Muitas pessoas acreditam que leitura se aprende durante a fase de alfabetização. Isso demonstra um entendimento muito vago do que seja efetivamente leitura. Pois ler não se refere apenas à capacidade de decodificar uma língua, seja ela a língua portuguesa ou qualquer outra.

A decodificação é apenas uma das dimensões ou um dos níveis de leitura, talvez o mais básico deles. Mas ler é, também, saber relacionar texto ao seu contexto tanto linguístico imediato, chamado dentro da Análise do Discurso, de co-texto, quanto ao contexto situacional em que o texto, leitor e a leitura estão inseridos, este sim, chamado verdadeiramente de contexto.

Essa segunda dimensão ou nível de leitura constitui a compreensão do texto. Para compreender um texto é preciso mais do que se pautar somente naquilo que está explícito no texto, é preciso ouvir também os silêncios que o constituem, seus implícitos, suas entrelinhas.

leitor que, além de decodificar consegue também compreender um texto, já é um leitor mais preparado que aquele que apenas reproduz o que está na superfície textual. Todavia, esse ainda é um leitor que precisa evoluir bastante para alcançar o nível de leitura desejável ao leitor proficiente, diríamos.

Mais do que decodificar e compreender um texto, é preciso compreender que a leitura envolve condições de produção, ou seja, ela não está dissociada de seu entorno: cultural, social, político, histórico e linguístico.

Essa reflexão deriva do fato de que a produção de sentidos, operada na/pela leitura, depende da ação de um sujeito, não como um ser individualizado, fechado em si mesmo, mas como ser constituído pelo tecido social.

contexto social é importante na ação da leitura não por determinar, mas por influenciar o que poderíamos entender como uma co-produção de sentidos operada na relação entre o sujeito-leitor e o sujeito-autor mediada pelo texto. Entendemos que esse contexto não se presta somente a ser pano de fundo para o sentido, mas participa de sua constituição, historicizando-o, situando-o. E, no mesmo alinhamento, entendemos que o sujeito-leitor é aquele que produz sua leitura a partir de sua inscrição nessa dinâmica, como sujeito social.

Essa postura nos leva a considerar, além da dinâmica social – que joga na constituição da linguagem e, consequentemente, do sujeito –, os atravessamentos do social pela ideologia e pela historicidade e a impossibilidade de se compreender a linguagem autonomamente, pautando-se na crença de significados anteriores ao discurso (texto) e à história, conforme propõe Orlandi (1988).

Um texto não surge do nada, descolado da época, dos modos de dizer-fazer de uma determinada cultura. Os conteúdos tratados nos textos dialogam aberta ou implicitamente com outros textos que formam aquilo que é chamado de outras vozes que compõem um texto. Pois como diria Mikhail Bakhtin, no famoso livro, Estética da Criação Verbal, nenhum sujeito/enunciado – entenda-se por extensão, texto – é um Adão bíblico. Isto é, nenhum texto lida com palavras "virgens", dotadas de sentidos sempre os mesmos e sempre iguais, independemente do tempo e do espaço em que ocorra. Portanto, o texto pode ser considerado um elo em uma cadeia de discursos.

Alcançar esse nível desejável de leitura, o nível mais profundo, o da interpretabilidade – interpretação – demanda um trabalho atento do leitor não só pensando na palavra dita do texto e nos seus não-ditos, mas também no seu entorno sociocultural, histórico e linguístico. É preciso relacionar o texto a outros textos já lidos ou ouvidos, relacioná-lo a suas condições de produção, para a partir de então, conseguir emitir criticamente um ponto de vista sobre os temas e conceitos nele apresentados.

Todavia, aquele que se poderia considerar como "mau" leitor não consegue, muitas vezes, sequer extrapolar o nível da decodificação, repetindo mecanicamente as palavras do texto, sem lhes perceber as ironias, as insinuações, as ambiguidades propositais, os jogos de significado e de sentidos propostos pelo texto. Outras vezes, não atentando para as relações estabelecidas pelas partes que compõem o texto, suas interdependências.

Outros, ainda que compreendam o texto não se propõem, na verdade, a estabelecer nenhum diálogo com a temática arrolada pelo autor que não aquele intermediado ou, por que não dizer, ofuscado por outra coisa que não seja seus próprios desejos interiores ou pelo conhecimento do senso comum. Parecem desconsiderar todo o conhecimento científico da área que estão estudando ou de outras áreas que tenham conhecimento para esvaziarem suas falas com enunciados e opiniões reproduzidos incansavelmente por pessoas não conhecedoras daquela área de ciência.

Não se trata aqui de diminuir os valores dos conhecimentos populares, trata-se, antes, da necessidade de travar-se um diálogo muitas vezes tenso entre o senso comum e o conhecimento científico, buscando ampliar as leituras de mundo dos leitores, acrescentarem-se novas perspectivas menos ingênua, mais problematizadoras e mais produtivas.

Se o leitor não se torna sujeito daquilo que lê, ou seja, não se apropria do texto, de sua relação com o outro sujeito-autor, para indagar-lhe, por meio dessa textualidade ou para ser indagado por ele, dificilmente conseguirá aproveitar satisfatoriamente qualquer material lido, seja de cunho científico ou não.

Cada uma dos níveis de leitura mencionados traz em seu bojo uma postura determinada para o sujeito-leitor. Tomada como uma forma de decodificação, a leitura nada mais é do que uma apreensão de um código seja ele verbal ou não verbal, no qual quem lê percebe literalmente o texto, sem um trabalho de contextualização maior. Se vista como uma forma de compreensão, o horizonte do leitor já se amplia, podendo agora usar o contexto como uma forma de participação no sentido do texto. E, por último, se percebida como uma forma de interpretação, a leitura rasga os limites do próprio texto e adentra o discurso, solicitando do leitor que dialogue, que relacione, que perceba o texto não como um começo e um fim, mas como um entremeio que tem um já-dito e um há se dizer.

Não se pode perder de vista, também, que não se lê da mesma forma qualquer tipo de texto. É preciso estabelecer uma "espécie" de pacto ou de protocolo de leitura adequado a cada gênero textual, ou seja, a cada formato. Muitos textos são lidos para aprender, muitos outros para divertir-se, outros ainda para orientar e assim sucessivamente, dependendo do objetivo da leitura.

Se na leitura feita por lazer, o fluxo pode ser contínuo, comumente dispensada até de marcações no canto do texto; na leitura para aprender, nem sempre se consegue ler continuamente: é preciso ler "parando", tentando relacionar os argumentos, as ideias centrais e secundárias, as sucessões temporais. É necessário ir preenchendo os "vazios", processando os pressupostos e as inferências, nos que o autor conta com o conhecimento do leitor para a complementação. Não raro é preciso fazer anotações no meio ou no canto do texto, marcando similaridades ou distanciamentos de outros autores que tratam da mesma temática, a fim de ir construindo o entendimento textual.

Ler para aprender é ir fazendo anotações; identificando os pontos-chave, os argumentos e os contra-argumentos desenvolvidos, a forma como o autor apresenta esses argumentos; anotando as palavras que as expressões que não compreendeu; tentando perceber naquilo que se sabe sobre as condições de produção do texto – quem, quando, onde, porque ou para quê – o que podem "dizer" sobre a temática e o ponto de vista desenvolvido; percebendo a "hierarquia" dos enunciados dentro do texto; qual a relação entre o escrito e o não escrito, no caso do texto apresentar imagens, por exemplo; é estabelecer a relação do assunto com a área tratada.

Ainda, carece de o aluno-leitor perguntar-se – o que sei sobre isso? O que já estudei sobre isso? – para ter condições de analisar, avaliar, julgar por parâmetros plausíveis, científicos e objetivos o material lido. Saindo assim do terrível "achismo" que, infelizmente, atravanca o aprendizado de muitos alunos.

Ler um texto para aprender, assim como escrever um texto evidenciando o aprendizado, é um trabalho, não obstante, demorado e que demanda não apenas concentração, mas estabelecimento de correlações variadas. Leitura e escrita não são dons, são competências advindas de um grande e profícuo trabalho, advindo de muito treino. Além disso, ler se aprende lendo e escrever se aprende escrevendo. São competências interligadas, mas não condicionadas uma a outra.

Decorre dessa visão da leitura como uma produção de sentidos, ancorada em vários fatores que extrapolam a mera decodificação das palavras, que a "ancoragem" que o leitor apresenta para servir-lhe ao estabelecimento de um diálogo produtivo e não meramente reprodutivo, é de suma importância para a qualidade da leitura realizada. Por isso, é preciso diversificar os gêneros textuais lidos e as fontes lidas.

Isso se se considerar o texto, no âmbito da palavra escrita, todavia, contemporaneamente a noção de texto estende-se a toda ocorrência linguística ou não linguística na qual seja possível a produção de sentidos. Assim, podemos ler um artigo de jornal, uma charge, uma placa de trânsito – seja ela simbólica ou linguística – uma fotografia, uma pintura, uma conversa, um filme etc..

Sendo assim, muda-se o protocolo de leitura, no caso de texto não linguístico, mas não muda a necessidade de estabelecerem-se relações que extrapolem a superficialidade do texto e sua compreensão.


Referência Bibliográfica:

ORLANDI, Eni P. Discurso e leitura. São Paulo: Cortez Editora, 1988.

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Fontes, 2003.

Arma com valor histórico não pode ser destruída

Li no consultor jurídico

POR PAULO JOSÉ IASZ DE MORAIS

Por vezes desprezamos a nossa história e destruímos marcos e as lembranças que nos fizeram chegar até o ponto que nos encontramos. Infelizmente, temos inúmeros exemplos dessa natureza em nosso país com importantes partes da história nacional esquecidas, abandonadas e destruídas. Apenas para citar um triste exemplo temos as charqueadas no estado do Rio Grande do Sul que estão abandonadas e destruídas, apesar de representarem a história de um importante período do Brasil Império.

Esse fato também se repetiu nas campanhas de desarmamento, anteriormente, estabelecidas pelo Governo Federal, uma vez que as mesmas desprezaram por completo a hipótese das armas de fogo com valor histórico que seriam entregues, como de fato foram, e, infelizmente, já destruídas.

Estima-se que mais de cinco mil armas de fogo com enorme valor histórico já foram destruídas em razão das duas campanhas de desarmamento realizadas pelo Governo Federal, armas essas que estavam guardadas junto das famílias brasileiras, e, que representavam períodos importantes da história brasileira e mundial.

Cumpre salientar que somos, evidentemente, favoráveis à campanha do desarmamento, bem como contra o processo de armamento da sociedade, não obstante entendermos que, infelizmente, as causas e as origens do problema do ingresso das armas de fogo de forma ilegal no país não estejam sendo atacadas adequadamente, haja vista que as mesmas não são adquiridas em estabelecimentos comerciais regularmente constituídos, mas sim do comércio ilegal, especialmente, por meio das nossas fronteiras mal vigiadas.

É compreensível a importância para a paz social e segurança pública brasileira que exista um controle rígido e efetivo das armas de fogo em mãos da sociedade civil, mas por outro lado não podemos desprezar a relevância da necessidade de manutenção do patrimônio histórico e cultural do país.

Assim, nossa preocupação e foco se concentram na importância da proteção e preservação de todas aquelas armas de fogo com grande valor histórico para nossa nação, e, que em vez de serem destruídas deveriam ser encaminhadas para os museus de todo nosso país para preservação da história de forma a garantir a memória dos fatos e acontecimentos para as gerações futuras.

Apenas para mencionar, na primeira e na segunda campanha do desarmamento do Governo Federal, foram recolhidas armas da revolução paulista de 1.932, armas oriundas da 1ª e da 2ª Guerras Mundiais, bem como armas oriundas do Leste Europeu do período da Guerra Fria, armas essas com enorme valor histórico.

Infelizmente, essa parte da história foi destruída.

A Lei 10.826, de 2002, o nosso Estatuto do Desarmamento, em seus artigos 31 e seguintes estabeleceu a hipótese da entrega de armas à Polícia Federal de forma espontânea mediante recibo de entrega e com indenização como forma de contrapartida pela entrega.

Assevera-se que a mencionada Lei foi regulamentada pelos Decretos 5.123, de 2004, e 6.715, de 2008, que estabeleceram o procedimento para a entrega das armas de fogo. Dessa forma, o artigo 70-E do Decreto 5.123, de 2004, estabeleceu em seu parágrafo único que as armas de fogo de que trata a Lei deveriam, obrigatoriamente, ser destruídas:

Art.70-E – As armas de fogo entregues na campanha do desarmamento não serão submetidas a perícia, salvo se estiverem com o número de série ilegível ou houver dúvidas quanto à sua caracterização como arma de fogo, podendo, nesse último caso, serem submetidas a simples exame de constatação.

Parágrafo Único – As armas de fogo que trata o caput serão, obrigatoriamente, destruídas.

Por seu turno a Constituição Federal em seus artigos 215 e 216 estabelecem a obrigação do Poder Público de zelar e preservar o Patrimônio Cultural e histórico do nosso país, e mais precisamente no inciso I, do artigo 215 restou estabelecida obrigação do Estado Brasileiro de defender e valorizar o patrimônio cultural.

O artigo 216, inciso III, estabelece que é patrimônio cultural brasileiro as criações científicas, artísticas e tecnológicas. As armas de fogo com valor histórico se incluem indiscutivelmente nesse inciso, uma vez que são criações científicas e tecnológicas, e por esse motivo devem ser preservadas para que gerações futuras possam saber da nossa história e das criações anteriormente ocorridas.

Portanto, tanto a Lei 10.826, de 2002, e os decretos que ela regulamentou deixaram de observar expressamente comando constitucional que objetiva a preservação da nossa cultura e história.

Nesse contexto dos acontecimentos, o Instituto do Patrimônio Histórico — não se confunde com o IPHAN —, entidade sem fins lucrativos que tem por escopo recuperar, conservar, zelar, amparar o patrimônio histórico e cultural brasileiro, sabedor do absurdo que vinha ocorrendo em razão da inadequação da norma interpôs ação civil pública com obrigação de fazer junto à Justiça Federal da 3ª Região.

Por essa razão, em 10 de junho de 2.010, a juíza da 12ª Vara Cível Federal de São Paulo, entendendo a relevância dos argumentos expostos, deferiu liminar determinando que a União, por meio da Polícia Federal se abstivesse da destruição das armas de fogo, sem que antes fossem produzidos os laudos de análise dos armamentos entregues na campanha de desarmamento para fins de constatar aquelas com valor histórico.

Na mencionada decisão restou determinada que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, por meio de técnicos qualificados, deveria atestar o valor cultural histórico das armas que corriam o risco de serem destruídas, não obstante sabermos que a própria Polícia Federal e o Exército possuem técnicos e profissionais capacitados para análise das armas de fogo com algum valor histórico.

Portanto, emerge desse importante decisório a possibilidade de proteção da cultura e história nacional com preservação daqueles armamentos que pelo tempo de fabrico estiveram ligados à Revolução Paulista de 1932, bem como ao período da 1ª e ou 2ª Guerras Mundiais, além daquelas armas que pelo tempo de fabricação têm por si só grande valor histórico, tudo em observância expressa ao comando constitucional.

Por outro lado, não se admite qualquer argumentação de que esse procedimento de análise das armas entregues para fins de constatação daquelas com valor histórico possa representar um ônus demasiado alto à sociedade, uma vez que os órgãos envolvidos, Polícia Federal e Exército, têm absoluta condição técnica para avaliar e atestar de plano o caráter de peça histórica sem maiores custos para a administração pública.

Além disso, o que está em jogo é a história e a cultura do nosso país que nos impõe o devido esforço para preservar e manter a memória nacional para que gerações futuras tenham os dados e informações corretos dos fatos ocorridos.

Note-se que apesar do recurso de agravo interposto pela Procuradoria da União a decisão restou mantida quanto ao seu fim, ou seja, as armas de fogo arrecadadas nas campanhas de desarmamento só poderão ser destruídas após a análise prévia e laudo para verificação do seu valor histórico.

Dessa forma, quando novamente nos vemos à frente de uma nova campanha do desarmamento que se estabeleceu, a partir de fato terrível ocorrido em uma escola pública do estado do Rio de Janeiro, torna-se relevante ressaltar a existência desse comando judicial em pleno vigor, uma vez que a decisão exarada deverá ser observada pelos órgãos governamentais envolvidos nessa nova campanha de desarmamento, de forma a preservar todas e quaisquer armas de fogo com valor histórico e cultural para que as mesmas, no futuro, possam ser encaminhadas aos museus de todo o nosso país.

PAULO JOSÉ IASZ DE MORAIS é advogado, conselheiro estadual da OAB-SP, sócio do escritório Morais - Advogados Associados, pós-graduado em Direito Comunitário pela Universidade Clássica de Lisboa - Instituto de Estudos Europeus, especializado em Direito Antitruste Brasileiro pelo Instituto dos Advogados de São Paulo e em Direito Penal Econômico em questões penais ligadas à atividade empresarial.

Armas com numeração raspada são equiparadas a armas de uso restrito, após outubro de 2005

Armas com numeração raspada são equiparadas a armas de uso restrito, após 23 de outubro de 2005, prazo estabelecido para que os proprietários as entregassem sem as penalidades. A data foi fixada pela Lei n. 11.191/2005, que alterou o Estatuto do Desarmamento (Lei n. 10.826/2003). A decisão é da maioria da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que acompanhou o voto do relator do habeas corpus, ministro Jorge Mussi.

Em 20 de novembro de 2006, foi apreendida na residência do réu uma arma calibre 32, municiada, de uso permitido para civis. Entretanto, a arma estava com a numeração de série raspada e ele foi acusado pelo delito do artigo 16 do Estatuto do Desarmamento, ou seja, possuir ou portar arma ou munição de uso restrito. A defesa do réu impetrou habeas corpus, mas este foi negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

No habeas corpus do STJ, a defesa alegou que a posse da arma se deu no período abarcado pelo abolitio criminis (abolição da pena de conduta até então proibida por lei) do Estatuto. Afirmou que o fato de a numeração estar raspada não interfere na atipicidade temporária garantida pela Lei n. 11.706/2008, que havia prorrogado o prazo para registro das armas de fogo de uso permitido até 31 de dezembro de 2008. Pediu, por isso, o trancamento do processo.

A questão seria determinar se a conduta do réu é ou não abarcada pela abolitio criminis especial da Lei n. 10.826/03, observou o ministro Jorge Mussi. O ministro relator destacou que os artigos 32 e 30 do Estatuto de Desarmamento determinaram um prazo de 180 dias para entregá-las à Polícia Federal, com a presunção de boa-fé e independente de registro. Após sucessivas prorrogações, o prazo de 23 de outubro de 2005 foi fixado para a entrega ou regularização de armas permitidas ou de uso restrito.

O prazo ainda foi alterado mais uma vez, para 31 de dezembro de 2008, pela Lei n. 11.706/2008. O ministro Mussi salientou, entretanto, que desta vez só armas permitidas podiam ser entregues, já que o registro passou a ser exigido. “Percebe-se, portanto, que é atípica a conduta relacionada ao crime de posse de arma de fogo, seja de uso permitido ou restrito, incidindo a vacatio legis nas duas hipóteses, se praticada no período compreendido entre 23 de dezembro de 2003 a 23 de outubro de 2005”, esclareceu.

Como a busca e apreensão da arma foi realizada em novembro de 2006, ou seja fora do prazo de abolitio criminis, o ministro Mussi entendeu que a conduta constitui crime. Além disso, observou o magistrado, a arma não foi entregue, mas encontrada na residência do réu. A maioria da Quinta Turma acompanhou o ministro Mussi.

Fonte: STJ

Resolução

CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA

RESOLUÇÃO No- 12, DE 25 DE MAIO DE 2011

Regulamenta a atuação da(o) psicóloga(o) no âmbito do sistema prisional

O CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, no uso de suas atribuições legais e regimentais, que lhe são conferidas pela Lei n° 5.766, de 20/12/1971; CONSIDERANDO o disposto no Art. 6º, letra "c", da Lei n° 5.766 de 20/12/1971, e o Art. 6º, inciso V, do Decreto n° 79.822 de 17/6/1977; CONSIDERANDO que a Constituição Federal, em seu Art. 196, bem como os princípios e diretrizes preconizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), definem que a saúde é direito de todos e dever do Estado; CONSIDERANDO as Regras Mínimas para Tratamento do Preso no Brasil (ResoluçãoNo- 14 de 11/11/1994), resultante da recomendação do Comitê Permanente de Prevenção do Crime e Justiça Penal da ONU, que estabelece em seu Art. 15 a assistência psicológica como direito da pessoa presa; CONSIDERANDO as "Diretrizes para Atuação e Formação dos Psicólogos do Sistema Prisional Brasileiro", elaboradas pelo Ministério da Justiça, Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e o Conselho Federal de Psicologia (CFP); CONSIDERANDO que as questões relativas ao encarceramento

devem ser compreendidas em sua complexidade e como um processo que engendra a marginalização e a exclusão social; CONSIDERANDO que a Psicologia, como Ciência e Profissão, posiciona-se pelo compromisso social da categoria em relação às proposições alternativas à pena privativa de liberdade, além de fortalecer a luta pela garantia de direitos humanos nas instituições em que há privação de liberdade; CONSIDERANDO que as(os) psicólogas(os) atuarão segundo os princípios do seu Código de Ética Profissional, notadamente aqueles que se fundamentam no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos; CONSIDERANDO o processo de profícua interlocução com a categoria, as teses aprovadas no IV, V, VI e VII Congresso Nacional de Psicologia (CNP), relativas ao sistema prisional, com o objetivo de regulamentar a prática profissional da(o) psicóloga(o) no âmbito do sistema prisional; CONSIDERANDO decisão desta Diretoria, ad referendum do Plenário do Conselho Federal de Psicologia, em reunião realizada no dia 25 de maio de 2011, resolve:

Art. 1º. Em todas as práticas no âmbito do sistema prisional, a(o) psicóloga(o) deverá respeitar e promover:

a) - Os direitos humanos dos sujeitos em privação de liberdade, atuando em âmbito institucional e interdisciplinar;

b) - Os processos de construção da cidadania, em contraposição à cultura de primazia da segurança, de vingança social e de disciplinarização do indivíduo;

c) - A desconstrução do conceito de que o crime está relacionado unicamente à patologia ou à história individual, enfatizando os dispositivos sociais que promovem o processo de criminalização;

d) A construção de estratégias que visem ao fortalecimento dos laços sociais e uma participação maior dos sujeitos por meio de projetos interdisciplinares que tenham por objetivo o resgate da cidadania e a inserção na sociedade extramuros.

Art. 2º. Em relação à atuação com a população em privação de liberdade ou em medida de segurança, a(o) psicóloga(o) deverá:

a) Compreender os sujeitos na sua totalidade histórica, social, cultural, humana e emocional;

b) Promover práticas que potencializem a vida em liberdade, de modo a construir e fortalecer dispositivos que estimulem a autonomia

e a expressão da individualidade dos envolvidos no atendimento;

c) Construir dispositivos de superação das lógicas maniqueístas que atuam na instituição e na sociedade, principalmente com relação a projetos de saúde e reintegração social;

d) Atuar na promoção de saúde mental, a partir dos pressupostos antimanicomiais, tendo como referência fundamental a Lei da Reforma Psiquiátrica, Lei n° 10.216/2001, visando a favorecer a criação ou o fortalecimento dos laços sociais e comunitários e a atenção integral;

e) Desenvolver e participar da construção de redes nos serviços públicos de saúde/saúde mental para as pessoas em cumprimento de pena (privativa de liberdade e restritiva de direitos), bem como de medidas de segurança;

f) Ter autonomia teórica, técnica e metodológica, de acordo com os princípios ético-políticos que norteiam a profissão.

Parágrafo Único: É vedado à(ao) psicóloga(o) participar de procedimentos que envolvam as práticas de caráter punitivo e disciplinar, notadamente os de apuração de faltas disciplinares.

Art. 3º. Em relação à atuação como gestor, a(o) psicóloga(o) deverá:

a) Considerar as políticas públicas, principalmente no tocante à saúde integral, à assistência social e aos direitos humanos no âmbito do sistema prisional, nas propostas e projetos a ser implementados no contexto prisional;

b) Contribuir na elaboração e proposição de modelos de atuação que combatam a culpabilização do indivíduo, a exclusão social e mecanismos coercitivos e punitivos;

c) Promover ações que facilitem as relações de articulação interpessoal, intersetorial e interinstitucional;

d) Considerar que as atribuições administrativas do cargo ocupado na gestão não se sobrepõem às determinações contidas no Código de Ética Profissional e nas resoluções do Conselho Federal de Psicologia.

Art. 4º. Em relação à elaboração de documentos escritos para subsidiar a decisão judicial na execução das penas e das medidas de

segurança:

a) A produção de documentos escritos com a finalidade exposta no caput deste artigo não poderá ser realizada pela(o) psicóloga(o) que atua como profissional de referência para o acompanhamento da pessoa em cumprimento da pena ou medida de segurança, em quaisquer modalidades como atenção psicossocial, atenção à saúde integral, projetos de reintegração social, entre outros.

b) A partir da decisão judicial fundamentada que determina a elaboração do exame criminológico ou outros documentos escritos com a finalidade de instruir processo de execução penal, excetuadas as situações previstas na alínea 'a', caberá à(ao) psicóloga(o) somente realizar a perícia psicológica, a partir dos quesitos elaborados pelo demandante e dentro dos parâmetros técnico-científicos e éticos da profissão.

§ 1º. Na perícia psicológica realizada no contexto da execução penal ficam vedadas a elaboração de prognóstico criminológico de reincidência, a aferição de periculosidade e o estabelecimento de nexo causal a partir do binômio delito-delinqüente.

§ 2º. Cabe à(ao) psicóloga(o) que atuará como perita(o) respeitar o direito ao contraditório da pessoa em cumprimento de pena ou medida de segurança.

Art. 5º. Na atuação com outros segmentos ou áreas, a(o) psicóloga(o) deverá:

a) Visar à reconstrução de laços comunitários, sociais e familiares no atendimento a egressos e familiares daqueles que ainda estão em privação de liberdade;

b).Atentar para os limites que se impõem à realização de atendimentos a colegas de trabalho, sendo seu dever apontar a incompatibilidade de papéis ao ser convocado a assumir tal responsabilidade.

Art. 6º. Toda e qualquer atividade psicológica no âmbito do sistema prisional deverá seguir os itens determinados nesta resolução.

Parágrafo Único - A não observância da presente norma constitui falta ético-disciplinar, passível de capitulação nos dispositivos referentes ao exercício profissional do Código de Ética Profissional do Psicólogo, sem prejuízo de outros que possam ser arguidos.

Art. 7º. Esta resolução entrará em vigor no dia 2 de junho de 2011.

Art. 8º. Revogam-se as disposições em contrário, em especial a Resolução CFPNo- 009/2010.

HUMBERTO VERONA

Conselheiro-Presidente

Incidem honorários em ação exibitória de documentos

Li no consultor Jurídico

POR JOMAR MARTINS

Em Medida Cautelar de Exibição de Documentos, incide o princípio da sucumbência. Logo, cabe à parte ré, se restou vencida no processo, arcar com o pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios. Este foi o entendimento da 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao dar provimento à apelação de um cliente que se insurgiu contra aspecto da sentença que deixou de condenar a BV Financeira a arcar com os honorários de sucumbência.

Na Ação Cautelar, ele teve reconhecido o direito de receber uma cópia do contrato de financiamento. O julgamento da apelação ocorreu no dia 7 de abril, com a presença dos desembargadores Sejalmo Sebastião de Paula Nery (relator), Judith dos Santos Mottecy e Roberto Sbravati. Cabe recurso.

O caso é originário da Comarca de Viamão, município vizinho a Porto Alegre. O consumidor ajuizou Ação Cautelar de Exibição de Documentos contra a BV Financeira, alegando que não possuía cópia do contrato firmado entre as partes. Logo, ficou impossibilitado de revisar as cláusulas contratuais. Pediu, e lhe foi concedida, a assistência judiciária gratuita.

Citada, a instituição financeira apresentou contestação. Rebateu as alegações presentes na inicial, juntando diversos documentos — dentre eles, o contrato firmado entre as partes. Requereu, ao final, a improcedência da ação.

O juiz de Direito Giuliano Viero Giuliato, da 2ª Vara Cível da Comarca de Viamão, entendeu como procedente o pedido do autor. "É que a parte demandada, ao exibir os documentos que trouxe aos autos, atendeu a pretensão deduzida na prefacial. É, pois, o que basta", registrou na sentença, autorizando desentranhamento das cópias dos documentos juntados, para entrega ao autor.

A discussão a respeito de eventual divergência existente entre as partes seria inócua, ponderou o magistrado, uma vez que tal fato deve ser analisado em ação própria.

Com relação às verbas de sucumbência, anotou o julgador que "devem as custas (judiciais) serem suportadas pela parte demandada, vez que trouxe aos autos documentos que o demandante não teria êxito em obter de outra forma". No entanto, o juiz Giuliano Giulato não arbitrou honorários advocatícios, por entender "incabíveis na espécie".

O autor apelou ao Tribunal de Justiça, pedindo a fixação da verba honorária. O desembargador Sejalmo Sebastião de Paula Nery, presidente do colegiado e relator do recurso, lembrou que, quando a parte ré junta aos autos os documentos solicitados, está reconhecendo a procedência do pedido, devendo arcar com os ônus da sucumbência.

Neste sentido, citou excerto de jurisprudência já pacificada no Tribunal: "É cabível a condenação em custas processuais e honorários advocatícios na Ação de Exibição de Documentos, porquanto, ainda que possa não ter havido resistência injustificada por parte do banco réu, não há dúvida de que se estabeleceu o litígio entre as partes, já que o demandado apenas exibiu o contrato de financiamento celebrado com a autora por meio do ingresso desta na via judicial. Sendo aplicável, na espécie, ainda, o princípio da causalidade, segundo o qual os honorários são devidos por aquele que deu causa à demanda ou ao incidente processual".

Conforme o desembargador-relator, se o réu contestar a ação, sobrevirá sentença, e a imposição do ônus de sucumbência será feita a quem, injustamente, tiver dado causa ao litígio. "Assim, o princípio da causalidade não será ferido", completou.

Em relação ao valor dos serviços, o relator disse que a advocacia deve ser bem-remunerada, em padrões condizentes com a sua importância para a administração da Justiça. "A verba honorária deve remunerar adequadamente o profissional que lançou mão de seus conhecimentos jurídicos e, com certeza, da estrutura do seu escritório, com o intuito de bem defender os interesses de seu cliente."

Com isso, fixou os honorários advocatícios em R$ 500, conforme o disposto no parágrafo 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil, considerando, também, o valor arbitrado pela Câmara em ações semelhantes.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão.

JOMAR MARTINS é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.

Questões de Família: diretrizes para psicólogos

Li no Xad Camomila

Questões de Família: diretrizes para psicólogos

A atuação do psicólogo como perito e assistente técnico no Poder Judiciário passou a dispor de diretrizes estabelecidas pela Resolução 008/2010 do Conselho Federal de Psicologia (veja aqui). O psicólogo perito é concursado pelo Judiciário e nomeado pelo juiz para assessorar questões de sua especialidade, devendo ter isenção com relação às partes envolvidas (embora não exerça a atividade desde 2006, época em que passei a coordenar os trabalhos do SCMC, este é meu cargo no TJ-SP). O psicólogo assistente técnico, por sua vez, atua como assessor das partes. No contexto de disputas que caracteriza o Judiciário, a Resolução busca garantir o respeito aos princípios éticos  que regem a atuação do psicólogo.

Em meados de 2005, tendo em vista o número elevado de representações levadas ao conhecimento do CRP/SP, o assunto começou a ser debatido de forma sistemática. Foram realizados encontros com a categoria e, em 2006, foi criado um Grupo de Trabalho com representantes do CRP/SP, psicólogos e entidades representativas na área, tais como: Associação dos Assistentes Sociais e Psicólogos do TJ-SP (AASPTJ-SP), Associação Brasileira de Psicologia Jurídica (ABPJ) e Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

Dos primeiros trabalhos resultou um conjunto de diretrizes que foram sugeridas e por fim endossadas pelo TJ-SP em 2008. Desde então, o debate se ampliou para outros Conselhos Regionais até se chegar à Resolução 008/2010.

A Resolução aborda a realização da perícia, a produção e análise de documentos, o termo de compromisso do assistente técnico e o papel do psicólogo que atua como psicoterapeuta das partes.

A íntegra da Resolução e os debates preparatórios ocorridos em São Paulo foram organizados e publicados, pelo CRP-SP, no "Caderno Temático nº 10 - Psicólogo Judiciário nas Questões de Família". O material, que está disponível para download (clique aqui), traz orientações fundamentais para quem atua na área. Vale a pena conferir!

Adeus amigo!!!

A despedida do trema

Estou indo embora. Não há mais lugar para mim. Eu sou o trema. Você pode nunca ter reparado em mim, mas eu estava sempre ali, na Anhangüera, nos aqüíferos, nas lingüiças e seus trocadilhos por mais de quatrocentos e cinqüentas anos.

Mas os tempos mudaram. Inventaram uma tal de reforma ortográfica e eu simplesmente tô fora. Fui expulso pra sempre do dicionário. Seus ingratos! Isso é uma delinqüência de lingüistas grandiloqüentes!...

O resto dos pontos e o alfabeto não me deram o menor apoio... A letra U se disse aliviada porque vou finalmente sair de cima dela. Os dois pontos disse que eu sou um preguiçoso que trabalha deitado enquanto ele fica em pé.

Até o cedilha foi a favor da minha expulsão, aquele C cagão que fica se passando por S e nunca tem coragem de iniciar uma palavra. E também tem aquele obeso do O e o anoréxico do I.

Desesperado, tentei chamar o ponto final pra trabalharmos juntos, fazendo um bico de reticências, mas ele negou, sempre encerrando logo todas as discussões. Será que se deixar um topete moicano posso me passar por aspas?... A verdade é que estou fora de moda.

Quem está na moda são os estrangeiros, é o K e o W, "Kkk" pra cá, "www" pra lá.

Até o jogo da velha, que ninguém nunca ligou, virou celebridade nesse tal de Twitter, que aliás, deveria se chamar TÜITER. Chega de argüição, mas estejam certos, seus moderninhos: haverá conseqüências! Chega de piadinhas dizendo que estou "tremendo" de medo. Tudo bem, vou-me embora da língua portuguesa.

Foi bom enquanto durou. Vou para o alemão, lá eles adoram os tremas. E um dia vocês sentirão saudades. E não vão agüentar!...

Nós nos veremos nos livros antigos. Saio da língua para entrar na história.
Adeus,

Trema.

terça-feira, 12 de julho de 2011

decadência, prescrição e perempção

diferenças

Incidem honorários em ação exibitória de documentos

do portal Consultor Jurídico

POR JOMAR MARTINS

Em Medida Cautelar de Exibição de Documentos, incide o princípio da sucumbência. Logo, cabe à parte ré, se restou vencida no processo, arcar com o pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios. Este foi o entendimento da 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao dar provimento à apelação de um cliente que se insurgiu contra aspecto da sentença que deixou de condenar a BV Financeira a arcar com os honorários de sucumbência.

Na Ação Cautelar, ele teve reconhecido o direito de receber uma cópia do contrato de financiamento. O julgamento da apelação ocorreu no dia 7 de abril, com a presença dos desembargadores Sejalmo Sebastião de Paula Nery (relator), Judith dos Santos Mottecy e Roberto Sbravati. Cabe recurso.

O caso é originário da Comarca de Viamão, município vizinho a Porto Alegre. O consumidor ajuizou Ação Cautelar de Exibição de Documentos contra a BV Financeira, alegando que não possuía cópia do contrato firmado entre as partes. Logo, ficou impossibilitado de revisar as cláusulas contratuais. Pediu, e lhe foi concedida, a assistência judiciária gratuita.

Citada, a instituição financeira apresentou contestação. Rebateu as alegações presentes na inicial, juntando diversos documentos — dentre eles, o contrato firmado entre as partes. Requereu, ao final, a improcedência da ação.

O juiz de Direito Giuliano Viero Giuliato, da 2ª Vara Cível da Comarca de Viamão, entendeu como procedente o pedido do autor. "É que a parte demandada, ao exibir os documentos que trouxe aos autos, atendeu a pretensão deduzida na prefacial. É, pois, o que basta", registrou na sentença, autorizando desentranhamento das cópias dos documentos juntados, para entrega ao autor.

A discussão a respeito de eventual divergência existente entre as partes seria inócua, ponderou o magistrado, uma vez que tal fato deve ser analisado em ação própria.

Com relação às verbas de sucumbência, anotou o julgador que "devem as custas (judiciais) serem suportadas pela parte demandada, vez que trouxe aos autos documentos que o demandante não teria êxito em obter de outra forma". No entanto, o juiz Giuliano Giulato não arbitrou honorários advocatícios, por entender "incabíveis na espécie".

O autor apelou ao Tribunal de Justiça, pedindo a fixação da verba honorária. O desembargador Sejalmo Sebastião de Paula Nery, presidente do colegiado e relator do recurso, lembrou que, quando a parte ré junta aos autos os documentos solicitados, está reconhecendo a procedência do pedido, devendo arcar com os ônus da sucumbência.

Neste sentido, citou excerto de jurisprudência já pacificada no Tribunal: "É cabível a condenação em custas processuais e honorários advocatícios na Ação de Exibição de Documentos, porquanto, ainda que possa não ter havido resistência injustificada por parte do banco réu, não há dúvida de que se estabeleceu o litígio entre as partes, já que o demandado apenas exibiu o contrato de financiamento celebrado com a autora por meio do ingresso desta na via judicial. Sendo aplicável, na espécie, ainda, o princípio da causalidade, segundo o qual os honorários são devidos por aquele que deu causa à demanda ou ao incidente processual".

Conforme o desembargador-relator, se o réu contestar a ação, sobrevirá sentença, e a imposição do ônus de sucumbência será feita a quem, injustamente, tiver dado causa ao litígio. "Assim, o princípio da causalidade não será ferido", completou.

Em relação ao valor dos serviços, o relator disse que a advocacia deve ser bem-remunerada, em padrões condizentes com a sua importância para a administração da Justiça. "A verba honorária deve remunerar adequadamente o profissional que lançou mão de seus conhecimentos jurídicos e, com certeza, da estrutura do seu escritório, com o intuito de bem defender os interesses de seu cliente."

Com isso, fixou os honorários advocatícios em R$ 500, conforme o disposto no parágrafo 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil, considerando, também, o valor arbitrado pela Câmara em ações semelhantes.

Clique aqui para ler a sentença e aqui para ler o acórdão.

JOMAR MARTINS é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.