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terça-feira, 21 de outubro de 2008

Como vencer um debate sem precisar ter razão

Certa feita tive a oportunidade de ver dois grandes advogados debaterem sobre um tema que não me recordo mais. Recordo-me e tenho saudades da forma com que foi travada guerra entre os dois causídicos: a cada argumento apresentado por um, o mesmo era rebatido pelo outro com maestria e inteligência invejável.

Por horas a fio fiquei ali extasiado com aquela discussão de mestres. Passado este tempo, um apoiou as mãos sobre o ombro do outro e abriram um sorriso de grandes amigos. Tal fato me surpreendeu, o que passou a prender-me mais ainda a atenção nos debatedores. Riram bastante juntos, e um deles comentou: “Não tem jeito! Você leu Schopenhauer também! Assim não dá”. Ao que o outro respondeu: “Infelizmente às vezes tenho de aplicar a dialética erística com colegas advogados, especialmente os sábios como você!”. Riram novamente e definiram a questão em mínimas palavras. O debate havia acabado em empate. As duas forças eram poderosas demais.

Neste dia começou minha obcecada busca pela Dialética Erística do filósofo alemão Arthur Schopenhauer. E tive a sorte de encontrar um exemplar com introdução, notas e comentários de outro filósofo de igual naipe: Olavo de Carvalho.

Quão grande foi minha surpresa ao desvendar o delicioso livro: é uma obra de patifaria intelectual! Perguntava eu, nas primeiras linhas, de onde viera tamanha aberração e logo fui encontrando a resposta pelas letras do próprio Schopenhauer: “Da perversidade natural do gênero humano”.

E imagino que meu leitor também esteja curioso para saber do que se trata o livro. Explico. É um estudo onde o Filósofo aponta em 38 estratagemas, formas de se argumentar num debate para que em qualquer situação, mesmo onde não tendo razão uma pessoa pode ser vitoriosa. Vou citar alguns interessantes:

1.                  Pré-silogismo: não deixe que seu ‘adversário’ descubra qual a conclusão que você quer chegar e vá apontando premissas que ele concorde. Premissas estas que após reunidas corroborem sua conclusão.

2.                  Perguntas em desordem: quando existe a oportunidade de questionar, não permita ao adversário ter um raciocínio crescente. Com uma saraivada de perguntas em total desordenamento ele certamente perde as condições para sustentar o que pretendia. Depois dele perdido em pensamentos inicie a aplicação de outro estratagema.

3.                  Encolerizar o adversário: “Em mente perturbada sabedoria não entra”. Depois de o adversário estar nervoso ele não consegue mostrar claramente o que pretende. Em platéias os ouvintes sempre dão razão aquele mais sóbrio. Todo aquele que  parte para a raiva tem a derrota assinada.

4.                  Falsa proclamação de vitória: depois de o adversário responder de forma deficitária a alguma pergunta anuncie sua vitória. É um argumento descarado, mas neste caso trata-se como prova o que não é prova daquela sua conclusão pretendida.

5.                  Mudar a controvérsia: se você perceber que pode perder o debate, escolha uma das premissas de seu adversário e passa a combatê-la. Mude o foco do debate para outra questão.

6.                  Do específico para o geral: quando a situação leva a um conceito certo algo muito definido, desvie o assunto para a generalidade. Na generalidade nunca existe certeza, assim fica mais fácil debater.

7.                  Impelir o adversário ao exagero: com este estratagema a vitória e certa. No exagero aparece as nuanças do fanático. Fanáticos sempre são derrotados. Cegos, eles não têm condições de argumentar nada do que você diz. Fortifique seu argumento e derrote-o com facilidade.

8.                  Argumento do sábio: quando a platéia é ignorante e você se perde num ou noutro detalhe. Procure um argumento que somente um sábio poderia destruir, aplique-o que os incultos vão acatar. Cite grandes nomes da história, nomes difíceis de articular, estrangeiros, mesmo que invente. Vale o argumento para a sua vitória sobre a ignorância de seu adversário.

9.                  Desvio insolente: levar o seu adversário a falar de fatos que não são pertinentes ao tema principal. Você o faz falar de coisas vagas e no que for possível firme o seu entendimento no tema principal.

10.               Ironia: ser irônico ao receber qualquer argumento de seu adversário. Ele sentirá incerteza no que está falando, procurará outros argumentos e se complicará cada vez mais. Mostre que é infantil demais a argumentação dele, que você espera algo maior, mais substancial: seja o mais irônico possível.

De forma muito mais apurada e com exemplos de aplicação, Arthur Schopenhauer apresenta seus 38 estratagemas para que um bom debatedor sempre seja vitorioso nos seus encontros dialéticos. Aliás, o segundo título do livro e o que usei para intitular este meu artigo.

Verifico que muitos juristas aplicam tais conhecimentos, políticos tem naturalmente esta tendência.

De fato é um manual de patifaria e maledicências para serem utilizadas no encontro de dois debatedores. Algo realmente perigoso em mãos erradas.

Mas no atual mundo onde as conversas e diálogos estão cada vez mais raros, o livro fica muito sub-utilizado.

Ver debates com aplicação destas argumentações é algo que ainda acho maravilhoso, especialmente com participantes de grande nível intelectual.

Fica pois a recomendação de leitura, e aplicação sóbria destes argumentos.

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