FIM DE PAGAMENTO
Por Ana Cláudia Banhara Saraiva
A maioria daqueles que já passaram pelos dissabores de uma separação judicial, hoje simplesmente divórcio, já se deparou com questões ligadas à prestação alimentícia. Senão por conta dos filhos, por conta de ex-cônjuges dependentes financeiramente. Tratando dessa segunda hipótese, algumas questões devem ser analisadas invariavelmente para se concluir sobre a necessidade ou não de uma das partes pleitear alimentos, e da possibilidade ou não da outra parte prestar alimentos.
Dados como o nível de dependência financeira existente entre ambos durante a relação conjugal, bem como idade do potencial alimentado, qualificação profissional, condições de inserção do ex-cônjuge no mercado de trabalho, dentre outros, são pontos analisados para que se fixe ou não pensão alimentícia em favor do ex-cônjuge.
Todos esses “requisitos” sempre foram estudados justamente com o intuito de se verificar a configuração dos dois pontos alicerces do necessário binômio que leva à fixação da pensão alimentícia ente ex-cônjuges, quais sejam, a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante.
Evidentemente, não há que se falar em pagamento de pensão alimentícia por um cônjuge a outro quando, ao se divorciarem, ambos estão inseridos no mercado profissional, aferindo rendas de maneira minimamente satisfatória, de modo que cada um seja capaz de manter seus próprios gastos pessoais em patamar semelhante ao havido durante a vigência do casamento. Nesse caso, inexistiria a “necessidade” por parte do alimentado. Da mesma forma, se nenhum dos dois possuir fonte de renda, inexistirá a “possibilidade” do alimentante.
Fato é que o binômio necessidade/possibilidade é invariavelmente analisado quando a questão é prestação de alimentos. No entanto, a peculiaridade de cada caso e os tempos modernos fazem com que determinadas questões acabem sendo analisadas de forma mais consciente pelos Tribunais, já que como diz o jargão popular, “os tempos mudaram”...
Com certeza, o ex-cônjuge de hoje em dia não pode ser comparado, sem nenhum desprestígio, é claro, àqueles que dedicaram sua vida à família e aos filhos no século passado e acabaram por experimentar as agruras de um divórcio atualmente!
A inserção destas pessoas no mercado de trabalho é quase inviável, infelizmente! Assim, não se pode imaginar que esses ex-cônjuges não terão direito a receber sua pensão alimentícia pelo tempo que lhe restar de vida, dentro dos termos legais.
No entanto, temos hoje um mercado de trabalho absolutamente aberto e propício à receber bons profissionais, principalmente as mulheres que outrora foram tão desprestigiadas! É certo que estas, muitas vezes deixam suas carreiras de lado com o incentivo do marido, na vigência do casamento, porém, não deixam de ter um grande potencial ao enfrentarem o divórcio com ainda muita vida produtiva pela frente! Nesses casos, dependendo das peculiaridades que acompanhem a situação que tentamos ilustrar, seria justo que a pensão alimentícia fosse “vitalícia”, ou dependesse unicamente do tão conhecido binômio necessidade/possibilidade?
Justamente diante desse cenário, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, recentemente, que é possível a exoneração do pagamento de pensão alimentícia devida a ex-cônjuge mesmo sem ter havido alteração nas condições econômicas dos envolvidos que reflitam no mencionado binômio.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir dois processos semelhantes, concluiu que outros fatores, além da capacidade financeira que tanto influi no binômio necessidade/possibilidade, também devem ser considerados na análise do pedido de exoneração de pensão alimentícia fixada entre ex-cônjuges, como a capacidade de trabalho do alimentado e o tempo necessário para que ele recuperasse a condição econômica que detinha durante o relacionamento.
De acordo com o entendimento da relatora dos casos, Ministra Nancy Andrighi, é necessário “considerar também a possibilidade de desoneração de alimentos dissociada de uma mudança na fortuna dos envolvidos”, quando não tiver sido verificada mudança negativa ou positiva na condição econômica dos dois. “A essa circunstância fática devem ser agregadas e ponderadas outras mais, como a capacidade potencial do alimentado para o trabalho e o tempo decorrido entre o início da prestação alimentícia e a data do pedido de desoneração”, afirmou a Ministra.
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a pensão alimentícia é determinada visando assegurar ao ex-cônjuge tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, de modo que possa manter pelas próprias forças status social similar ao do período do relacionamento. O pagamento perpétuo só é determinado em situações excepcionais, quando, segundo a Ministra, há “a existência de uma das exceções à regra da temporalidade dos alimentos devidos a ex-cônjuge, que são a impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho ou a incapacidade física ou mental para o exercício de atividade laborais”.
Temos assim um novo panorama surgindo no que diz respeito à desoneração de pensão alimentícia fixada entre ex-cônjuges e é fácil perceber que este, é muito condizente à realidade atual.
Ana Cláudia Banhara Saraiva é advogada da Miguel Neto Advogados em São Paulo.
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