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terça-feira, 10 de abril de 2012

A retirada de crucifixos das salas dos tribunais parece ter atendido a vontade do crucificado

do
Assessoria Jurídica Popular de Luiz Otávio Ribas

Por Jacques Alfonsin, desde Porto Alegre-RS
Segue artigo publicado pelo IHU Notícias em 7 de abril de 2012, "A retirada de crucifixos das salas dos tribunais parece ter atendido a vontado do crucificado":

"O debate sobre a retiradados crucifixos em locais públicos tem encontrado o seu eixo principal a partirda natureza jurídica do Estado laico e da liberdade de religião e culto.Ninguém até agora, ressalvada alguma exceção, parece ter-se preocupado muitocom a opinião do Crucificado", escreve , Jacques TávoraAlfonsin, advogado do MST e procurador aposentado do estado doRio Grande do Sul. É mestre em Direito, pela Unisinos, onde também foiprofessor. É membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos e membrodo Conselho deDesenvolvimento Econômico e Social – CDES.

Segundo ele,"é certo, comoargumenta a defesa da permanência dos crucifixos onde eles se encontram, elaservir de advertência grave contra toda a injustiça. É para que ela, alitestemunhada, jamais se repita. Também é certo, todavia, o mal decorrente de umsímbolo de tal significado não passar de uma decoração inútil, quando a faltade humildade de uma autoridade que está a serviço do povo, serve-se dela paraoprimi-lo".

Eis o artigo.

O significado histórico do maisfamoso julgamento da história, lembrado todos os anos na sexta-feira santa,ganhou maior repercussão, aqui no Rio Grande do Sul, em virtude da acesadiscussão estabelecida sobre ordem de autoridade determinando a retirada decrucifixos em locais públicos do Poder Judiciário.

O debate tem encontrado o seueixo principal a partir da natureza jurídica do Estado laico e da liberdade dereligião e culto. Ninguém até agora, ressalvada alguma exceção, parece ter-sepreocupado muito com a opinião do Crucificado.

A recordação das causas pelasquais Ele foi processado e condenado, o peso representado por suas críticas àsdesigualdades sociais flagrantes e injustas mantidas pelas autoridades deentão, o conluio religioso-político que planejou a sua morte, as regrasprocessuais que presidiram o processo do seu julgamento, os  efeitos quedecorreriam do assassinato a ser praticado “de acordo com a lei” (!?), pareceterem ficado às costas de toda a cogitação, como, aliás, os crucifixos sãopregados nas paredes das salas de audiência dos foros e dos tribunais,acumulando pó e indiferença.

A começar pelo fato de que oHomem Amado e Venerado como Deus por grande parte da humanidade foi privado dedefesa, humilhado e torturado antes mesmo de ser levado ao julgamento, já seriao caso de se perguntar quantas/os das/os suas/seus seguidoras/es de hoje, jánão chegam aos tribunais na mesma condição, como o profeta Isaiasprevira:

“Era desprezado, era a escóriada humanidade, homem das dores, experimentado nos sofrimentos; como aqueles,diante dos quais se cobre o rosto, era amaldiçoado e não fazíamos caso dele.Mas ele foi castigado por nossos crimes, e esmagado por nossas iniquidades”(...) Por um iníquo julgamento foi arrebatado. Quem pensou em defender suacausa, quando foi suprimido da terra dos vivos, morto pelo pecado de meu povo?”

Não é exatamente isso queacontece quando os preconceitos ideológicos e culturais que viciam ainterpretação das leis contra pobres e marginalizados ignoram as flagrantes einjustas condutas denunciadas pelas palavras do Condenado Inocente quando Esseestabeleceu como parâmetros do julgamento justo, precisamente o reconhecimentoético-político-jurídico da dignidade humana das/os pobres?

“Eu tive fome e me destes decomer,tive sede e me destes de beber, fui peregrino e me acolhestes, estive nue me vestistes, enfermo e me visitastes, estava preso e viestes ver-me”.

Não é exatamente contraestamentos de poder, semelhantes a muitos de hoje, virando as costas para os crucifixos,que uma censura das mais severas partiu da boca do Condenado inocente? “Amarram pesadas cargas e as põem nas costas dos outros e eles nem com o dedoquerem tocá-las.” (...) “...não vos preocupais do mais importante da lei: ajustiça, a misericórdia e a fidelidade!” (...) “Guias cegos, que filtrais ummosquito e engolis um camelo. (...) “sois semelhantes a sepulcros caiadosvistosos por fora mas por dentro cheios de ossos dos mortos e de toda a sortede hipocrisia e iniquidade.”

É certo, como argumenta a defesada permanência dos crucifixos onde eles se encontram, ela servir de advertênciagrave contra toda a injustiça. É para que ela, ali testemunhada, jamais serepita. Também é certo, todavia, o mal decorrente de um símbolo de talsignificado não passar de uma decoração inútil, quando a falta de humildade deuma autoridade que está a serviço do povo, serve-se dela para oprimi-lo.  Portudo isso, salvo engano aqui antecipado por ousar exercer também liberdade deopinião a respeito de matéria muito maior do que uma ordem sobre imagem, existeuma grande possibilidade de Jesus Cristo estar agradecendo ao Seu Pai por suacruz ter sido retirada dos tribunais.

Assim, pelo menos a imagem dainjustiça que Ele padeceu liberta-se do constrangimento de assisti-locrucificado de novo a cada sentença que repete a iníqua condenação de tantagente na qual ele se encontra Encarnado.

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